Foto: Zanuel Hube/Divulgação |
ENTREVISTA ZAMUEL HUBE
O pintor, casado, pai de quatro filhos, e uma das maiores revelações da pintura contemporânea, falou ao NEWSBASTIDORES sobre a importância da arte engajada e de como o talento, aliado à perseverança e dedicação, são as chaves fundamentais para alcançar o sucesso.
Entrevista e Tradução Por MÁRCIO WALTER MACHADO
Quando a arte se tornou parte de sua vida?
Já na
infância. Pois, para minha sorte, cresci vendo meu tio pintar suas telas com
navios enormes, cenários comuns, e outros motivos da arte tradicional. Desde
aquela época, eu gostava de observar atentamente o trabalho dele e os quadros
nas paredes das casas de meus familiares, especialmente uma pintura fantástica que
havia na sala de meus avós e que decorava o ambiente com um cenário típico
finlandês: um lago, um céu azul e bétulas. O lago parecia um espelho e eu
queria pôr meu dedo ali para quebrar a monotonia de sua superfície. Depois,
quando entrei na adolescência, comecei a me interessar mais por pintura e tive
a ajuda do meu tio, que me orientou com dicas importantíssimas. Nessa altura, eu
também gostava de esculpir pequenos objetos em madeira e desenhar, e comecei a
participar de concursos de arte, em alguns dos quais eu me dei muito bem.
Quando terminei o Ensino Médio, a escola me deu um prêmio pelos meus trabalhos
com arte em vidro e pelos desenhos. O valor era apenas 200 marcos finlandeses (aproximadamente
30 euros), mas essa pequena quantia foi muito importante como forma de incentivo à minha crença em
mim mesmo como artista.
Foi nessa época que você fez sua primeira exposição?
Quando eu estava com vinte e poucos anos, a Associação de Artistas da minha cidade natal, Pori, montou uma exposição com pintores locais e algumas de minhas telas foram selecionadas e expostas junto com a de vários artistas conhecidos da região. Meus quadros foram todos vendidos a meus familiares e amigos, então, comecei a pintar com mais afinco e a procurar algumas galerias de arte para expôr meu trabalho. Mas isso foi só o começo. Pouco tempo depois, já morando em Helsinki, descobri, fazendo uma caminhada, que uma importante galeria da cidade estava montando uma exibição e que o tema era bem parecido com o que eu estava pintando na época. Não pensei duas vezes: entrei na galeria, procurei o curador e apresentei meu trabalho a ele. O resultado foi que alguns dias depois minhas pinturas estavam sendo exibidas em Helsinki com os quadros de artistas plásticos profissionais, entre os quais muitos dos meus pintores favoritos.
A partir daí você se tornou um nome nacional?
A exposição teve uma cobertura enorme da imprensa e minhas telas receberam críticas muito favoráveis. Num jornal de alcance nacional, inclusive, eles disseram que eu era "uma descoberta com um estilo ímpar e um toque bastante pessoal". Houve também críticas muito boas numa exposição seguinte da qual eu participei. Mas o grande divisor de águas ocorreu durante um importante festival de música chamado EUROVISION, em 2007. Quando eles anunciaram que naquele ano a Finlândia sediaria o evento, eu fiz um acordo com a galeria para ter uma exposição exclusiva nos dias do certame. Aí, pensei num tema que tivesse a ver com todo o clima festivo que a cidade estava experimentando, com todas as cores e alegria que envolvem essa competição e criei minha série o Toureiro Bailarino, a qual representava o lutador alegre vestido de vermelho, o acrobata flexível, o entusiasta e, mais importante, aquele que tem a vida em suas próprias mãos. A exposição foi um sucesso, minhas telas chegaram a ser vendidas para outros países como Alemanha e Estados Unidos. Assim, eu apareci na cena finlandesa com o Toureiro Bailarino! Que engraçado, não é?
O quanto a arte espanhola influencia sua obra?
Eu adoro a arte e a cultura espanholas, especialmente porque eu sinto que os espanhóis não levam a vida tão a sério. Eles encontraram um jeito peculiar de viver a vida diariamente. Uma exceção óbvia é Salvador Dali. Ele era muito zeloso de seu trabalho e, por causa disso, ele se tornou um dos artistas mais famosos do mundo. Ele tinha uma obsessão por pintar e criar coisas diferentes e eu encontrei paralelos entre sua obsessão e a minha.
Foi nessa época que você fez sua primeira exposição?
Quando eu estava com vinte e poucos anos, a Associação de Artistas da minha cidade natal, Pori, montou uma exposição com pintores locais e algumas de minhas telas foram selecionadas e expostas junto com a de vários artistas conhecidos da região. Meus quadros foram todos vendidos a meus familiares e amigos, então, comecei a pintar com mais afinco e a procurar algumas galerias de arte para expôr meu trabalho. Mas isso foi só o começo. Pouco tempo depois, já morando em Helsinki, descobri, fazendo uma caminhada, que uma importante galeria da cidade estava montando uma exibição e que o tema era bem parecido com o que eu estava pintando na época. Não pensei duas vezes: entrei na galeria, procurei o curador e apresentei meu trabalho a ele. O resultado foi que alguns dias depois minhas pinturas estavam sendo exibidas em Helsinki com os quadros de artistas plásticos profissionais, entre os quais muitos dos meus pintores favoritos.
A partir daí você se tornou um nome nacional?
A exposição teve uma cobertura enorme da imprensa e minhas telas receberam críticas muito favoráveis. Num jornal de alcance nacional, inclusive, eles disseram que eu era "uma descoberta com um estilo ímpar e um toque bastante pessoal". Houve também críticas muito boas numa exposição seguinte da qual eu participei. Mas o grande divisor de águas ocorreu durante um importante festival de música chamado EUROVISION, em 2007. Quando eles anunciaram que naquele ano a Finlândia sediaria o evento, eu fiz um acordo com a galeria para ter uma exposição exclusiva nos dias do certame. Aí, pensei num tema que tivesse a ver com todo o clima festivo que a cidade estava experimentando, com todas as cores e alegria que envolvem essa competição e criei minha série o Toureiro Bailarino, a qual representava o lutador alegre vestido de vermelho, o acrobata flexível, o entusiasta e, mais importante, aquele que tem a vida em suas próprias mãos. A exposição foi um sucesso, minhas telas chegaram a ser vendidas para outros países como Alemanha e Estados Unidos. Assim, eu apareci na cena finlandesa com o Toureiro Bailarino! Que engraçado, não é?
O quanto a arte espanhola influencia sua obra?
Eu adoro a arte e a cultura espanholas, especialmente porque eu sinto que os espanhóis não levam a vida tão a sério. Eles encontraram um jeito peculiar de viver a vida diariamente. Uma exceção óbvia é Salvador Dali. Ele era muito zeloso de seu trabalho e, por causa disso, ele se tornou um dos artistas mais famosos do mundo. Ele tinha uma obsessão por pintar e criar coisas diferentes e eu encontrei paralelos entre sua obsessão e a minha.
Uma obsessão que levou Dali a ser expulso da Academia de Artes, em 1926. Você continuou seus estudos em Artes Plásticas?
Eu fiz os exames para o curso de Artes, mas não entrei. A realidade é que é muito difícil entrar nas escolas tradicionais, e, para ser sincero, eu já tinha escolhido meu caminho antes de pensar em cursar a Faculdade, daí eu nunca ter ficado magoado nem triste por não ter passado. Talvez as coisas tivessem de ser assim mesmo. Obviamente, para alunos dos cursos de Arte, é mais fácil conseguir projeção como pintores, por causa do apoio e investimento na área, pois a estrutura do ambiente artístico tradicional na Finlândia é muito bem consolidada, por isso é difícil para um outsider, aparecer em cena. Especialmente para quem quer despontar e fazer sucesso na elite artística contemporânea.
Eu fiz os exames para o curso de Artes, mas não entrei. A realidade é que é muito difícil entrar nas escolas tradicionais, e, para ser sincero, eu já tinha escolhido meu caminho antes de pensar em cursar a Faculdade, daí eu nunca ter ficado magoado nem triste por não ter passado. Talvez as coisas tivessem de ser assim mesmo. Obviamente, para alunos dos cursos de Arte, é mais fácil conseguir projeção como pintores, por causa do apoio e investimento na área, pois a estrutura do ambiente artístico tradicional na Finlândia é muito bem consolidada, por isso é difícil para um outsider, aparecer em cena. Especialmente para quem quer despontar e fazer sucesso na elite artística contemporânea.
No entanto, sua arte é reconhecida e admirada. Por quê?
As escolas de Arte e o mercado esperam que pintores talentosos desafiem
o público e a própria arte per se. Então, não é exatamente isso que eu estou
fazendo como outsider? Eu tenho tudo
o que é preciso para ter sucesso: autoconfiança, humildade para aprender, mas
arrogância em relação à minha arte, porque sei que sou talentoso, tenho uma
visão clara e eclética, e tenho o que chamamos de sisu finlandês, significando uma atitude de enorme força de
vontade, ousadia, vivacidade.
Essa é sua característica mais forte?
Meu ponto
mais forte é dar tudo de mim em relação à arte. Porque sempre me foi claro aonde
eu queria chegar tão logo conseguisse desenvolver meus talentos. Sempre tive
uma ideia clara dos meus ideais. Por isso, nunca fui muito crítico em relação
ao meu trabalho artístico no início da minha carreira. Simplesmente focava em
como melhorar, em vez de me focar na falta de habilidade técnica. Então, se
você sabe e crê que lá adiante você vai dominar a coisa, simplesmente se libere
e deixe que tudo venha à tona, mesmo se no começo tudo parecer horrível. Você tem de saber quem você é, o quão bom você é e qual o seu papel,
mas não ser muito crítico em relação ao seu trabalho, pois isso só retarda seu
progresso. Meu caminho como pintor autodidata é obviamente mais comprido e mais
pedregoso, e, claro, muito mais cheio de decepções do que o de alguém que foi à
Academia, mas, ainda assim, eu não mudaria nada nele. Tudo valeu a pena, tudo é
parte da minha vida e eu amo tudo o que vivi.
Como
você define seu estilo?
Eu
sou surrealista, ou, como gosto de dizer, surrealista finlandês. Tenho grande admiração
pela obra de Salvador Dalí, Marc Chagall e André Breton, mas sem copiá-los. Consegui
criar meu próprio estilo e minha forma peculiar de expressão com equilíbrio
único entre natureza, mar e vento.
André Breton, em seu “Manifesto do
Surrealismo”, de 1924, diz que o homem é um “sonhador inveterado”. Você também é
um?
Eu
sou. Não somos todos? Eu acho que esse é um elemento importante em sermos
humanos. Nós estamos constantemente sonhando com alguma coisa. É isso que nos
faz caminhar e crescer. O problema é que as pessoas estão sonhando com tantas coisas
ao mesmo tempo, que tudo aquilo que é importante sonhar juntos perde a harmonia.
Assim, algumas vezes parece que as pessoas se esquecem das coisas básicas de
ser humano. Já o meu sonho, enquanto surrealista, é com um mundo que
ofereça um pouco mais de inspiração para todos nós.
O mundo atual tem destruído a inspiração?
O
que eu noto é que hoje em dia a gente tem feito enormes mudanças apenas para
mudar, não para melhorar. Não consigo entender toda a correria que a gente tem
desde cedo de manhã até à noite, que a gente repete dia após dia, ano após ano,
até não ter mais forças para continuar. E aí a gente percebe que nessa hora
tanto nós quanto nosso trabalho chegamos ao fim. A gente para e pensa em todos os
nossos relacionamentos e percebe que nunca teve tempo para se dedicar de
verdade a eles. O que precisamos mudar para viver uma vida mais humanizada?
Você diz que, ao planejar suas telas,
sua ideia principal “é criar um mundo alternativo”. Estaria aí a resposta?
O
mundo alternativo está na imaginação do expectador para o qual eu dou a direção a
fim de proporcionar uma liberação da mente e fazê-lo desafiar seu próprio
pensamento conservador, controlado, levando-o à condição de relaxamento,
enquanto ele revê seus valores e sua moral e se sente num lugar seguro, com
cenários familiares, para que libere o que está escondido e se entregue aos
relacionamentos, à vida, à natureza.
As
Fábricas de Ventos, que você
considera seu melhor tema, tem toda
essa ideia de vida e natureza. De alguma forma elas sofreram a influência dos
Surrealistas?
As Fábricas
de Ventos provavelmente têm menos influência de outros artistas do que os
meus projetos anteriores, inclusive, toda a história da Fábricas de Ventos veio de minha própria imaginação, do profundo de
minha alma. Essa é certamente umas das razões porque eu gosto demais delas. O
projeto é todo meu, de ninguém mais. Além disso, há a preocupação com o nosso
país, a nossa natureza singular, com nossos milhares de lindos lagos e com o
Mar Báltico. Creio que o tema é relevante por causa de toda essa coisa de energias
renováveis, força eólica, recursos naturais, etc. Foi essa singularidade de sua obra que o levou a estar entre os 10 artistas contemporâneos mais talentosos da Finlândia num Reality Show na TV de seu país, em 2012?
Eu diria que o que me levou ao programa Taiteilijaelämää Salmelassa (Vida de Artista em Salmela) foi meu trabalho árduo, talento e sorte, desde a exposição com o Toureiro Bailarino, em 2007, e as seguintes até 2011. Para esse show (que era transmitido uma vez por semana durante dois meses em cadeia nacional e pela internet), eu fui selecionado num concurso de arte para jovens pintores entre muitos que tinham passado pela Academia e tinham muitas referências.
A participação no programa ajudou ou atrapalhou?
Pra ser sincero, depois do programa eu alcancei um sucesso que jamais teria imaginado. Eu pude finalmente conquistar algo realmente grandioso e tive a prova concreta que minha carreira artística não era apenas uma ilusão. Especialmente quando vi na TV os campeões do hockey naquele ano, heróis nacionais, comentando sobre minha arte e comprando meus quadros. Foi algo realmente impactante. De outra forma, eu provavelmente ainda estaria concentrado apenas em produzir arte. Então, eu fico feliz que as coisas tenham tomado essa direção. Pois, no que diz respeito à minha obra, eu não tenho mais aquela pressão de ter conquistas e ficar sob os holofotes; agora eu posso me concentrar em melhorar meu trabalho, focar em outras áreas importantes da minha vida, e dedicar mais tempo às pessoas de minha convivência. Acho que finalmente alcancei a paz em minha alma nesse sentido.
Sua obra já foi exposta no Porto, em Bolonha, e em várias partes da Finlândia. Há alguma exposição sua no momento?
No momento eu estou em processo de criação, mas não estou participando de nenhuma exposição. Apesar de ter alguns projetos com Bruno Maximus e Panu Hemminki - dois artistas que eu admiro imensamente. Aliás, desde o ano passado, quando houve as comemorações pelo centenário da Independência da Finlândia, eu dei um tempo para me dedicar a outras áreas importantes de minha vida.
Se você pudesse resumir o mundo em algumas palavras, o que seria?
O mundo está em constante mudança. Cada um de nós determina que caminho seguir. Não por palavras ou pensamentos, mas por ações. Então, faça a diferença.
A Fábrica de Vento - ZAMUEL HUBE - Óleo sobre tela |
Obras e sites que o pintor mencionou durante a entrevista:
https://zamuelhube.net/moments-and-places/#jp-carousel-63
https://zamuelhube.net/moments-and-places/#jp-carousel-382
http://brunomaximus.net/
http://www.panuhemminki.fi/index.php/en/english/
Mto legal a entrevista! Como fã do surrealismo, fico mto Feliz em saber q em diferentes partes do mundo, apesar do fim do movimento com a segunda guerra, ainda existem resquícios significativos do mesmo por aí. Zanuel pinta mto!!! Adorei
ResponderExcluirVerdade! Zamuel é um pintor extremamente sensível talentoso. Fiquei muito feliz em ele ter nos dado essa entrevista. Assim, pude conhecer mais um pouco do surrealismo contemporâneo pelos olhos dos finlandeses.
ExcluirObrigado.